Com 1ª fábrica de carros recém-inaugurada no Brasil, chinesa GWM planeja a 2ª

Investimentos da montadora chinesa no Brasil até 2032 deve chegar a R$ 10 bilhões. Na semana passada, Lula participou da inauguração da unidade do interior de SP. Estados tentam atrair segunda

A montadora chinesa Great Wall Motor (GWM) pode ter acabado de inaugurar sua primeira fábrica no Brasil, mas já está buscando locais para uma segunda unidade de produção enquanto aumenta suas ambições em relação à maior economia da América do Sul.

A unidade de Iracemápolis, em São Paulo, foi inaugurada em 15 de agosto, quatro anos após a Great Wall ter comprado da Daimler AG. Três modelos serão produzidos lá — os SUVs Haval H6 e H9, e a picape Power P30.

Embora tenha capacidade para produzir 50.000 veículos por ano, o CEO da GWM International Parker Shi disse que a empresa pretende eventualmente vender entre 250.000 e 300.000 carros no país, incluindo veículos fabricados localmente e importados.

Estados fazem proposta

A Great Wall vem mantendo conversas e já recebeu propostas de alguns estados, incluindo Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Espírito Santo, disse Ricardo Bastos, diretor de Assuntos Institucionais da GWM Brasil, em entrevista na inauguração da fábrica.

— Podemos eventualmente olhar uma opção de uma fábrica maior pela consolidação, mas existe também a oportunidade de se construir uma fábrica do zero, com alguns benefícios disponíveis nos estados, e não necessariamente pegando estruturas antigas — disse Bastos.

Uma decisão final a respeito de uma segunda fábrica deve ser tomada a partir de meados de 2026, acrescentou.

Uma nova fábrica poderia ser usada como polo de produção de uma nova família de veículos, preenchendo uma lacuna na linha de produtos da GWM no país. Enquanto a maior concentração do ticket médio do setor no Brasil está em modelos com preços ao redor de R$ 150.000 (US$ 27.700), a gama da GWM tem preços acima de R$ 200.000.

— Precisamos ter produtos competitivos nesse segmento, abaixo de 200.000 — disse o diretor.

Os novos veículos podem incluir um SUV menor que o H6 e uma picape compacta, ambos derivados de uma nova plataforma múltipla.

Estamos falando, com certeza, de um projeto que faz parte do futuro da GWM”, afirmou Bastos ao explicar que a família de produtos não vai se limitar a um ou dois modelos e que a experiência com o mercado brasileiro poderia ser replicada em outras localidades onde a GWM tenha manufatura. — O Brasil tem servido de laboratório de boas experiências, seja de marca, seja de relacionamento com os concessionários.

A antiga fábrica da Mercedes-Benz, em Iracemápolis, a 164 quilômetros da capital paulista foi repaginada e inaugurada na semana passada pela GWM na presença do presidente Lula, é parte dos R$ 10 bilhões que a Great Wall prometeu investir no Brasil, incluindo R$ 4 bilhões até 2026 e os R$ 6 bilhões restantes até 2032.

São 570 funcionários, sendo cerca de 80 chineses, que estão em funções específicas, como programação de robôs, ou em postos de comando.

O que vem pela frente

A segunda fase dos investimentos deve ser direcionada a várias frentes, como a cadeia de fornecedores, a possibilidade de explorar outros negócios —como veículos pesados— e também a montagem dos pacotes das baterias dos veículos, uma iniciativa que Bastos indicou como importante para elevar o nível de localização de componentes.

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Se a bateria for considerada nacional, ela aumenta o conteúdo local, permitindo à GWM alcançar o mínimo obrigatório de 35% de localização para poder exportar ao Mercosul. O planejamernto da companhia é que esse nível de 35% seja alcançado ao longo de 2027.

Centro de pesquisa foi anunciado na abertura

A cerimônia de inauguração da fábrica de Iracemápolis contou com a presença do CEO da GWM, Mu Feng, que visitou o Brasil pela primeira vez, e o presidente Lula. Durante o evento, a empresa anunciou a criação de seu primeiro Centro de Pesquisa e Desenvolvimento na América do Sul, que contará com mais de 60 técnicos e engenheiros trabalhando em produtos locais, com foco na tecnologia flex-fuel e na adaptação de veículos globais às condições de rodagem brasileiras.

— Há muito espaço para o que estamos propondo fazer no Brasil: cuidar bem do consumidor, ter uma política de preço único e uma política em que possamos atender os clientes com a nossa rede de forma saudável — pontuou Bastos.

A GWM espera vender 36.000 veículos no Brasil em 2025, um aumento de 23% em relação a 2024 e acima da previsão de 31.000 unidades anunciada no início deste ano.

Mercedes fechou fábrica

A Mercedes fabricou na unidade de Iracemápolis, de 2016 até 2021, o SUV compacto GLA e o sedã médio Classe C. Mas a montadora encerrou a produção alegando que a conjuntura econômica do país, agravada pela pandemia, não estava adequada, causando queda nas vendas. Nesse cenário, fazer novos investimentos na unidade buscando a eletrificação de seusveículos não fazia sentido.

No mês passado, a também chinesa BYD (Build Your Dreams) mostrou a primeira parte de seu complexo industrial de Camaçari, onde no passado funcionou uma unidade da Ford. Lá, a BYD vai produzir o SUV Song Plus, um híbrido plug in, e o elétrico Dolphin Mini. A empresa anunciou que vai produzir pelo menos 50 mil veículos por ano na primeira fase subindo depois para 150 mil. A BYD anunciou investimentos de R$ 5 bilhões no país, sendo que R$ 1,4 bilhão foram desembolsados na unidade baiana, que já emprega quase mil pessoas.

Brasil é alvo das chinesas

O Brasil tornou-se destino de várias marcas chinesas de veículos. De acordo com o professor de cursos automotivos da Fundação Getúlio Vargas, Antônio Jorge Martins, com forte concorrência no mercado interno, a saída para elevar as margens de ganhos é se internacionalizar.

— O mercado chinês deve passar por um processo de consolidação. Enquanto isso, a produção excedente é vendida para países como o Brasil — diz o especialista, lembrando que o mercado chinês passa por uma verdeira guerra de preços, reduzindo a margem de ganho das montadoras. Mas assim como fizeram Europa e Estados Unidos, o imposto sobre veículos elétricos importados no país vem subindo e vai chegar a 35% em 2026.

Além da BYD e da GWM, marcas como a GAC, Omoda e Jaecoo e Geely, estão dispostas a brigar pelo consumidor nacional. Com muita tecnologia embarcada e luxo, elas estão trazendo modelos diferentes da primeira onda de carros chineses que desembarcou no Brasil no final dos anos 2000 e início de 2010. Seja por problemas de qualidade, falta de infraestrutura de pós-venda, ou dificuldades em se adaptar ao mercado local, muitas acabaram saindo do país.

—As marcas chinesas mudaram em relação a 15 anos e hoje entregam qualidade, tecnologia, e itens de segurança, design e, em sua maioria, eletrificação — diz Milad Kalume, da consultoria K. Lume especializada no setor autormotivo.

Mesmo com infraestrutura de carregamento dos veículos elétricos ainda abaixo do que se espera, especialmente no interior do país, as vendas de veículos eletrificados vem crescendo no Brasil. Em julho passado, foram vendidas 23.509 unidades, equivalentes a 10,7% do total de vendas no mês.

O resultado representa uma alta de 56,3% frente a julho de 2024 (15.043). No acumulado do ano, foram 134.664 unidades, um crescimento de 44,3% sobre 2024 (93.326), segundo dados da consultoria Bright Consulting.

O aumento do interesse dos compradores pelos veículos eletrificados, a oferta de novos modelos chineses importados e o início de produção local da BYD e da GWM esquentam a briga entre os veículos eletrificados, e especialistas avaliam que o consumidor pode ser beneficiado com descontos e queda de preços nesse cenário de aumento da concorrência. 

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